É preciso ter um estômago de couro para digerir a quantidade de asneiras perpetradas através da mídia cabo friense sobre o fatídico desabamento do deck da Praia do Forte, onde a Prefeitura - literalmente - deu com os burros n'água.
Começamos o dia tendo de engolir, junto ao café da manhã, o sr. Amaury V. profetizar que o acidente teria sido obra de Deus - afinal, quem manda no mar é ele. Isso me fez lembrar o falecido policial Mariel Mariscot, da Scuderie Le Coq, que dizia que quem matava era Deus - ele só fazia os furinhos.
O dia segue e, lá pela hora do almoço, somos brindados pelo brilhantismo técnico de uma cientista-bióloga-oceanógrafa-meteorologista-repórter, Renata Cristiane, que encerra sua matéria sobre o acontecido afiançando que tudo foi devido ao aquecimento global, que derreteu as calotas polares e fez com que o nível do mar subisse - assim, de uma hora pra outra: mês passado estava tudo geladinho lá na Antártida, mas na semana que passou fez um calorão, derreteu tudo e o que aconteceu aqui foi, provavelmente, um tsunami - notícia a qual fomos poupados certamente por ela não pretender disseminar o pânico na cidade.
Para arrematar, brinda-nos um blog - que só não é homônimo por meu muito protestar contra o uso indevido do nome OPINIÃO - com um show de bom senso, lógica férrea e sensatez à toda prova, zurrando para quem queira ler uma detalhada análise pericial da sequencia de acontecimentos que levaram ao sinistro.
Segundo o mesmo, aqueles que protestaram dizendo que cansaram de avisar e a Prefeitura nada fez não passam de uns néscios (procure no dicionário, amiguinho blogueiro), já que - segundo sua lógica asinina - se o município tivesse feito o que tem por obrigação fazer, a ressaca teria destruído tudo mesmo assim.
É tênue a linha que separa a mais profunda ignorância da má fé, e prefiro acreditar num eventual dolo - afinal o cara é formado, tem diploma - do que em pura e simples deficiência cerebral.
Seria bom deixar bem claro que o deck desabou por causa do impacto das ondas sobre o mesmo e por causa da corrosão na estrutura metálica. E por que as ondas quebraram sobre o mesmo? Porque a faixa de areia foi removida pela ressaca já ocorrida há bastante tempo, semanas e semanas de areias minguadas sem que a Prefeitura tivesse providenciado o óbvio: aterrar, elevar urgentemente o nível da areia.
Dormiram todos, deu preguiça, não fizeram. Ponto.
Mas e a corrosão na estrutura metálica? Afinal, nosso técnico afirmou, com sua perspicácia, que era um absurdo fazer uma estrutura metálica sem o devido revestimento de proteção em área marítima, sujeita à corrosão - no que foi imediatamente endossado pelos puxa sacos de plantão, desejosos de pregar Alair Corrêa numa cruz e declará-lo a razão dos males da humanidade. Afinal, vigas metálicas na areia da praia? Que absurdo!
Já o outro, o rubicundo Obronho, assegura que a culpa é dos prédios, dos quiosques, do calçadão, e por aí vai.
Pois bem: não sou cientista, nem meteorologista, nem oceanógrafo e muito menos entendo de ferro como os já citados - e longe de mim posar de teólogo ou profeta para culpar Deus por tudo - mas mesmo assim atrevo-me a raciocinar.
Esquecendo a manutenção periódica da estrutura - leia-se "manter o zarcão em ordem", obrigação da Prefeitura que não foi cumprida - gostaria que me respondessem: se as vigas foram feitas para desabar já que são metálicas, por quê diabos esses engenheiros burros fazem navios de ferro? Saudades do Titanic ou é mesmo para durar só um ano e a companhia ser obrigada a encomendar outro?
Pelo mesmo motivo das vigas, será que igual burrice assolou os caras que projetaram a ponte Golden Gate, suspensa por - pasmem! - cabos de aço?
Então vamos sair da área técnica e ir para a lógica pura e simples: e por quê a Prefeitura não sentou logo umas boas toneladas de pedras na praia logo após a primeira ressaca, a real causadora do sumiço da areia? Não tinham pedra para vender? Ou acharam que a praia ia ficar feia, virar muro de contenção? Mas seria só jogar areia por cima e tudo ficaria lindo de novo! Ou será - novamente a maldita soberba - que os engenheiros que fizeram o calçadão de Copacabana - bairro repleto de prédios, calçadões, quiosques e, que eu saiba, ainda invicto em sua Avenida Atlântica jamais desabada - eram todos uns burros e tudo o que eles fizeram lá não serviria aqui?
E o que fazer com uma repórter que diz para seu público que a cidade está afundando graças ao aquecimento global?
E quanto ao outro, o profeta, que acredita piamente que Deus é o responsável por ter dado a vitória à Marquinho Mendes e depois, só pra zoar, mandou umas ondas mal criadas tocarem um terror na praia?
E quanto à nós, leitores, diante deste mar de burrice - esta sim, verdadeira enchente de asneiras que ameaça nos afogar dia à dia, em seu afã incessante e diligente para impôr o relincho no lugar do raciocínio?
Fico pensando que a mesma humanidade que produziu um Leonardo Da Vinci, um Einstein, um Platão, foi a mesma que pariu repórteres e blogueiros sem o menor pudor em proclamar enormidades como as que somos obrigados a sofrer todos os dias. Deve haver alguma razão espiritual, metafísica, sei lá, para isso.
Ou então erraram a data, 2012 é conversa e o mundo já acabou faz tempo. Isso sim, faz sentido.
FONTE: Blog Opinião
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