Por Pedro Nascimento Araujo
No mês de janeiro de 2012, o Brasil arrecadou mais de 100 bilhões de reais em impostos. O governo, usando seus dedos ágeis, subtraiu de nossas economias, apenas no primeiro mês do ano, para usar um exemplo tristemente em voga, uma Síria. Um governo que dispõe de uma Síria por mês para gastar pode fazer coisas boas e coisas ruins.
Como as coisas ruins que podem ocorrer com uma Síria nos são mostradas diariamente por seu próprio ditador, Bashar al-Assad, vamos analisar as coisas boas. É aqui que vemos que estamos desperdiçando nossos recursos. Nada justifica que um país que possui uma Síria por mês para gastar consiga dar duas demonstrações de incompetência na gestão de sua Marinha. O que aconteceu com o Porta-Aviões São Paulo e com a Estação Comandante Ferraz - uma tragédia apresentada por um ministro da defesa atônito vestindo um blazer três números acima - pode ser um chamado à realidade para nossas forças de defesa: o Brasil precisa cuidar melhor da Marinha do Brasil.
Em um país cuja história militar foi forjada em lutas de cavalaria contra caudilhos vizinhos terrestres de Argentina, Paraguai e Uruguai, além de guerras civis também majoritariamente terrestres, é natural que o Exército tenha se tornado a arma nacional mais proeminente. Porém, mais de um século depois de encerradas as grandes desavenças com nossos vizinhos imediatos - a ponto de sermos sócios no moribundo Mercosul - o Brasil precisa entender que a Marinha é, também, uma grande vocação. Não virtualmente hegemônica, como ocorre com Estados Unidos (um país bioceânico com fronteiras terrestres com apenas dois vizinho, México e Canadá) ou Reino Unido (país insular), mas com uma importância equivalente à do Exército.
A Marinha do Brasil precisa do básico. Falar em investimentos bilionários para construir um único submarino nuclear quando nosso melhor porta-aviões, o São Paulo, é uma cinquentenária barcaça francesa que pegou fogo pela segunda vez em 6 anos, só pode ser escárnio com os mais de 1 000 homens que arriscam suas vidas servindo à pátria nele. Esses homens sabem que o velho Foch (nome francês de batismo da belonave no ano de 1957) não aguentaria uma disputa séria com nenhum inimigo minimamente moderno. Estamos muito, muito mal equipados. Querer reverter tal quadro gastando bilhões (e décadas) para construir um submarino nuclear é mais que vaidade pueril: ainda que já o possuíssemos, de pouco adiantaria dispor de um submarino nuclear quando o melhor vaso de guerra é um cinquentenário porta-aviões francês - o qual, por sua vez, dispõe de apoio naval precário, sem mencionar seus defasados aeroplanos. A Marinha precisa urgentemente de um programa de modernização de equipamento.
Além disso, a Marinha precisa de um sistema de manutenção de acidentes mais eficaz. O outro caso a expor o sucateamento da Marinha do Brasil foi o trágico incêndio na Estação Antártica Comandante Ferraz, que culminou com a morte de dois militares. As causas ainda serão apuradas e não há nada que autorize falar sobre responsabilidades, mas é sintomático ao colocar a Marinha em meio a mais uma má notícia que envolve condições de operação. O governo brasileiro arrecada mais de uma Síria por mês. Com essa quantidade de dinheiro subtraída de nossos bolsos, tirada de nosso suor, é injustificável não ter uma Marinha capaz de patrulhar, de forma sistemática, firme e dissuasiva, nossos 8 mil quilômetros de litoral. O Brasil nunca teve a Marinha que precisa, mas não precisa maltratar a Marinha que tem.
Pedro Nascimento Araujo é economista.
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