Por Pedro Nascimento Araujo
Há algo de intrinsecamente errado na política econômica brasileira. Algo que não aparece nos números de forma clara e, quando aparece, geralmente é exaltado. Falo dos mais de 350 bilhões de dólares que o Brasil mantém em reservas internacionais e cujo serviço custa quase 50 bilhões de dólares ao ano para manter. Apesar das frases de efeito (o ministro da fazenda falou em “tsunami monetário”), o câmbio não mudará. Vejamos porque, começando pelas reservas internacionais.
As reservas são, muitas vezes, apresentadas pelo governo como uma vantagem. Há uma espécie de trauma com o que ocorreu em 1999, quando o Brasil ficou com suas reservas praticamente zeradas e teve de flexibilizar o câmbio, abandonando a âncora cambial que ajudou a controlar a inflação nos primórdios do real. No regime de câmbio semifixo que vigorava à época, ter muitas reservas era importante. No de câmbio flutuante atualmente vigente, não.
Ocorre que o Brasil simplesmente não pode abrir mão deste mar de reservas internacionais. Há dois componentes pressionando: a estratosférica taxa de juros do Brasil e a não menos estratosférica liquidez do sistema internacional. É fácil entender como essa combinação nos custa 50 bilhões de dólares por ano: em 2011, o Brasil teve um déficit no balanço de pagamentos da ordem de 58 bilhões de dólares. Isso implica dizer que entraram no Brasil 58 bilhões de dólares somente em 2011 – se tal dinheiro não entrasse, simplesmente não teríamos como financiar nosso déficit. Evidentemente, o resto do mundo não nos manda sua poupança para financiar-nos a troco de nada. Na verdade, nós pagamos muito bem para termos nosso déficit coberto: enquanto o governo dos Estados Unidos se financia pagando 0,25% ao ano de juros e o da Alemanha a pouco mais de 1%, o governo do Brasil se financia pagando mais de 10%.
A lógica é simples: os agentes econômicos pegam dinheiro naqueles juros baixíssimos dos americanos e alemães e o aplicam aqui. Lucro certo, especialmente levando-se em conta que o Brasil tem o chamado grau de investimento – uma virtual garantia anticalote. Somado a isso, há as ações expansionistas de americanos e europeus. Literalmente, centenas de bilhões de dólares foram injetados nessas economias desde 2008, numa tentativa frustrada de evitar o aprofundamento da crise. Esse dinheiro extra busca lucros em nossos juros elevados, financiando nosso déficit e pressionando para baixo a cotação do dólar. Excesso de liquidez e juros altos são como faísca e gasolina. Enquanto o Brasil não fizer as reformas estruturais que nos permitam reduzir os juros, qualquer ação será paliativa. A perspectiva para 2012 é de déficit recorde. Ou seja, precisaremos do dinheiro da poupança externa. Poderíamos, ao menos, não ter de pagar tanto por ele.
Pedro Nascimento Araujo é economista.
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