Por Pedro Nascimento Araujo
As eleições municipais de 2012 terão um componente, no
mínimo, inusitado. O governador, por definição o mais importante líder político
do estado, não deve participar ativamente do pleito. Isso é ainda mais
surpreendente quando nos lembramos de que Sérgio Cabral foi reeleito em
primeiro turno há 1½ ano com votação recorde. Não que Cabral tenha sido
igualmente popular em todo o estado do Rio de Janeiro durante seu primeiro
mandato. Na verdade, no interior sempre houve certa reticência em relação a
ele, principalmente devido à liderança de Anthony Garotinho, tido como um
governador que privilegiava mais a região em seu governo que ele. Isso não impediu
a reeleição de Cabral.
Estrela em ascensão, seria de se esperar que Cabral
continuasse sua trajetória positiva na política. Ainda jovem, acumula no
currículo uma passagem pelo Senado e duas pelo governo do segundo estado mais
importante do país. Foi um astuto articulador político: em seu governo, o Rio
de Janeiro, que, durante as gestões de Garotinho e Rosinha, devido à oposição
deles presidente Lula, era o penúltimo estado do Brasil em termos de
investimentos da União, chegou a assumir a liderança nacional. Além disso,
Cabral tem realizações de peso para mostrar. Em sua gestão, o governo criou as
UPPs e retomou territórios há décadas dominados por bandidos. As finanças do
Rio de Janeiro estão saudáveis, graças ao planejamento de Joaquim Levi. Uma agenda
de eventos de repercussão mundial está a caminho: Rio + 20 em 2012, Jornada
Mundial da Juventude em 2013, Copa do Mundo FIFA em 2014 e Jogos Olímpicos de
Verão em 2014 – a Copa América de 2015, prevista para ser no Brasil, foi
repassada para o Chile. Grandes investimentos, públicos e privados, estão em curso. O PMDB,
partido do governador, controla politicamente o estado, sendo titular das
principais prefeituras e majoritário na Assembleia Legislativa. Não obstante,
com 2½ anos de governo pela frente, Sérgio Cabral, que frequentemente era
considerado possível candidato presidencial na coligação PT-PMDB para a
sucessão de Dilma, assemelha-se a um morto-vivo.
A revelação das ligações íntimas de Cabral com Fernando
Cavendish, dono da empreiteira Delta Construções, principal beneficiária das
obras do PAC e do governo estadual, e da empresa com Carlinhos Cachoeira,
bicheiro ora investigado por uma CPMI, foram o estopim de sua desgraça.
Reveladas pelo blog de Garotinho, seu desafeto, as fotos de Cabral, seus secretários
e Cavendish em Paris são um dos mais bem acabados exemplos de relação promíscua
entre autoridades e pessoas que têm negócios com o governo controlado por essas
autoridades. Sem contar que são de um mau gosto ímpar: o que vemos são pessoas
riquíssimas deslumbradas como não se imaginaria. Pessoas que escolhem vinho
pelo preço, não pela qualidade. Pessoas que escolhem marcas pelo preço, não
pela qualidade. Pessoas que falam alto em restaurante. Em
suma, pessoas de baixo nível. Quando o povo descobriu que o círculo
politicamente mais importante do estado do Rio de Janeiro é um grupo de pessoas
grossas que compartilha promiscuamente o público e o privado, a carreira
política de Cabral acabou. Se ele sonhava em ser presidente, agora ficará
contente se não sofrer processo de impeachment por conta de favorecimento à
empresa de Cavendish.
O governador não deve subir em nenhum palanque em 2012 e em
2014 – sua presença, no volátil mundo político, é garantia de, no mínimo, uma
coisa indesejável: desvio de foco da cobertura da imprensa do candidato a
prefeito para ele. Ou, caso a situação política de Cabral se deteriore ainda
mais, associação do nome do candidato a um governador moribundo e envolvido em
escândalos de corrupção de alcance nacional. Por isso, o mais provável é que
Cabral fique recluso até o final de seu governo. Não quer atrair atenção para
si. Não deixa de ser irônico, levando-se em conta o quão vaidoso ele é. O fato
é que, até o nome de Cachoeira surgir associado ao senador Demóstenes Torres e
à Delta, ninguém imaginaria esse fim precoce de um governador jovem que tem
tantas realizações. Na verdade, o ocaso de Cabral mostra o amadurecimento do
povo: o “rouba, mas faz”, máxima política de Adhemar de Barros, é cada vez
menos aceito. Cabral fez bastante, mas, suspeito de corrupção, está decaindo.
Seu ocaso indica um amadurecimento político do povo brasileiro.
Pedro Nascimento Araujo é economista.
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