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Passaportes Diplomáticos da República Federativa do Brasil.




Por Pedro Nascimento Araujo

A não ser que ocorra uma improvável reviravolta, nesta semana o Diário Oficial da União publicará a concessão de Passaporte Diplomático da República Federativa do Brasil ao seguinte casal de brasileiros: Valdemiro Santiago de Oliveira e Franciléia de Castro Gomes de Oliveira. Para aqueles que não são familiarizados com a miríade de denominações cristãs protestantes neopentecostais brasileiras, o casal em tela é líder da Igreja Mundial do Poder de Deus, um colosso da fé que conta com mais de 3½ mil templos no país. Dissidência da Igreja Universal do Reino de Reino de Deus, outra potência religiosa, liderada por Edir Macedo e da qual Marcelo Crivella é expoente político, a Igreja Mundial do Poder de Deus atua fortemente em divulgação por meio de horários pagos da televisão aberta, e é notadamente associada ao Grupo Bandeirantes. Como o Passaporte Diplomático é, por definição, destinado a diplomatas de carreira, a autoridades autorizadas a representar a República Federativa do Brasil no exterior e a pessoas que, segundo o Ministério das Relações Exteriores, “representem o interesse do país” em missões especiais no estrangeiro, e provê ao titular virtual isenção de filas e de revistas pela Polícia Federal no retorno ao Brasil, convém escrutinar as razões subjacentes ao fornecimento de tão raro documento ao referido casal.

Nossa análise começa, forçosamente, pelo governo Lula da Silva. Durante o período no qual ele governou o Brasil, houve vários episódios de uso pouco republicano de prerrogativas e de privilégios. Mensalão à parte, alguns dos mais escandalosos, certamente, envolveram a concessão de Passaporte Diplomático a 7 familiares do ex-presidente. Os filhos de Lula da Silva, bem como um neto dele de, à época, 14 anos, receberam o mimo do Itamaraty – alguns, inclusive, emitidos a 3 dias do fim do segundo mandato do ex-Presidente. Somem-se a isso fatos como o ocorrido em 09-Out-2009, quando um Boeing 737 da FAB, que levava militares de Gavião Peixoto (SP) a Brasília (DF) e se encontrava a 10 minutos de aterrissar em Brasília, retornou a Guarulhos (SP) para “dar carona” a Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha – com o detalhe que, após ser reabastecido, o avião voou para o aeroporto de Congonhas, em São Paulo (SP) para pegar o “caroneiro”. Não cabe discorrer aqui sobre outros eventos correlatos, como os 14 amigos de Luís Cláudio, outro filho de Lula da Silva, que foram levados em avião oficial para passar 15 dias das férias de Julho de 2004 no Palácio da Alvorada, com despesas de churrasco na Granja do Torto paga com o dinheiro dos nossos impostos, porque o foco reside nos Passaportes Diplomáticos. Em meio a toda essa imoralidade com o uso do dinheiro público – ou, como eu prefiro chamar, com o uso do dinheiro do nosso trabalho que é tirado do nosso bolso – o governo Lula da Silva começou a distribuir Passaportes Diplomáticos para líderes religiosos, dentre os quais se encontram o casal Valdemiro Santiago de Oliveira e Franciléia de Castro Gomes de Oliveira.

A justificativa para o fornecimento de Passaporte Diplomático a lideranças cristãs protestantes neopentecostais é um acinte ao Itamaraty, órgão governamental que, em priscas eras, constituía uma das maiores fontes de orgulho do serviço público brasileiro por sua independência e por sua coerência, chegando, mesmo, a discordar do Poder Executivo quando julgava que as determinações deste não seriam condizentes com o bem do país – é clássico, nos corredores do Itamaraty, o caso de um Embaixador junto ao Chile que simplesmente não entregou uma mensagem de um Presidente mercurial que, pensando com o fígado, carregou nas tintas e arriscou expor o país a uma crise internacional por veleidades. Para justificar o fornecimento de Passaporte Diplomático aos líderes religiosos, dentre os quais estão célebres comunicadores de massa como Edir Macedo e R. R. Soares, entre outros, o Itamaraty alegou estar praticando isonomia com a Igreja Católica – um argumento que não resiste a um parágrafo, conforme veremos a seguir.

Representantes da Igreja Católica não têm Passaporte Diplomático por serem membros da Igreja Católica. Aqueles representantes da Igreja Católica que o possuem, o fazem por meio da Santa Sé, que tem relações diplomáticas com o Brasil. Conquanto haja uma robusta discussão doutrinária acerca de o Vaticano ser ou não um Estado no Direito Internacional hodierno, é cediço que a Santa Sé é um sujeito de Direito Internacional que celebra contratos com Estados, dentre eles o Brasil, e, como tal, possui representantes diplomáticos acreditados – especificamente, os Núncios Apostólicos. Não importa, aqui, que a Igreja Católica tenha chegado ao Brasil com as caravelas de Pedro Álvares Cabral; importa, aqui, que a Santa Sé pode ter diplomatas no Brasil e que o Brasil pode ter diplomatas na Santa Sé – para ser mais exato, desde 1808, quando o Núncio Apostólico para Portugal veio ao Brasil com o então Príncipe Regente D João. Desde 1829, há, portanto, exatos 184 anos, a Santa Sé tem relações diplomáticas oficiais com o Brasil. Os Núncios Apostólicos têm Passaporte Diplomático emitido pela Santa Sé e reconhecido pela República Federativa do Brasil, que mantém relações diplomáticas com a Santa Sé. Como nenhuma outra religião no mundo possui um sujeito de Direito Internacional como a Santa Sé, simplesmente não é razoável evocar isonomia de outras religiões com a Santa Sé: é simplesmente comparar denominações religiosas com sujeitos de Direito Internacional – coisa que não faz sentido, como não faz sentido fornecer Passaporte Diplomático da República Federativa do Brasil para suprimir a diferença entre religiões e sujeitos de Direito Internacional. Assim, se, malgrado o fato de nenhuma outra religião possuir uma personalidade jurídica internacional, o atual governo brasileiro considera tão absurdo manter relações diplomáticas apenas com a Santa Sé a ponto de ser capaz de fornecer Passaportes Diplomáticos para os líderes das demais religiões para purgar o que entende como distorção inaceitável, que este governo tenha, então, a coragem de romper relações diplomáticas com a Santa Sé – só não podemos admitir que tenha a desfaçatez de utilizar um fato do Direito Internacional como escusa para praticar demagogia à custa da própria idiossincrasia concernente à Santa Sé.

A bem da verdade, é importante frisar que não são apenas líderes de denominações cristãs protestantes neopentecostais que possuem Passaporte Diplomático no Brasil. Uma vez que o governo Lula da Silva resolveu afagar lideranças religiosas como Edir Macedo e R. R. Soares, o benefício foi estendido para expoentes de outras religiões, como as afrodescendentes. Trata-se de um desdobramento típico de uma demagogia que foge ao controle. É preciso que fique claro: tão importante quanto quem são os agraciados com o Passaporte Diplomático é o motivo pelo qual foram agraciados. Os Passaportes Diplomáticos dos parentes de Lula da Silva foram cassados por ordem da Justiça Federal não porque eram parentes do ex-presidente, mas porque eram ilegais e imorais. Os Passaportes Diplomáticos dos líderes religiosos também são imorais. Ao invés de não apenas se recusar a concedê-los ao casal Valdemiro Santiago de Oliveira e Franciléia de Castro Gomes de Oliveira, como também a cassar os já emitidos, a Presidente Dilma Rousseff deixou clara sua opção pela manutenção de três coisas lamentáveis: a demagogia e a imoralidade no trato com os Passaportes Diplomáticos, o desrespeito pelo Itamaraty e o desprezo pela relação diplomática que o Brasil mantém com a Santa Sé há tantos anos.

Pedro Nascimento Araujo é economista.

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