Por Pedro Nascimento Aruajo
Em meio ao escárnio que
significam 39 Ministérios, há alguns que realmente têm relevância; dentre eles,
há o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior,
compreensivelmente mais conhecido pela sigla MDIC, localizado no J Bloco da
Esplanada dos Ministérios, e comandado por Fernando Pimentel, político do
Partido dos Trabalhadores (PT) e um dos articuladores da eleição de Dilma
Rousseff em 2010. Para quem não é familiarizado com a política mineira, o nome
de Fernando Pimentel, um pouco midiático prefeito de Belo Horizonte nos anos
2000, não deve evocar nada de extraordinário, exceto pelo escândalo dos 2
milhões de reais que recebeu após deixar a prefeitura, formado por um mal
explicado contrato de consultoria com a Federação de Indústrias do Estado de
Minas Gerais (FIEMG), sobre a qual a entidade não apresentou nenhum documento
de realização, e por um ainda pior explicado contrato de consultoria com a
Convap, empresa que, após a referida consultoria, também sem documentos probatórios,
ganhou obras de quase 100 milhões de reais da Prefeitura de Belo Horizonte
durante a gestão de Márcio Lacerda (PSB), seu sucessor e apadrinhado político.
O governo da presidente Dilma Rousseff ignorou esses conflitos de interesse em
2012, quando a Comissão de Ética da Presidência da República arquivou as
investigações acerca das consultorias do ministro com a inacreditável
justificativa de que o valor não representava “nada de extraordinário”, nas
palavras de Américo Lacombe, que presidiu os trabalhos.
Em que pese ser um acinte que
beira o deboche para milhões de brasileiros considerar “nada de extraordinário”
os 2 milhões de reais aferidos de forma eticamente questionável por Fernando
Pimentel, não há cinismo que justifique uma manobra feita na última pelo
próprio Pimentel: colocar R$ 1, 75 bilhão (ou US$ 875 milhões) que o Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) destinou para
investimentos em Angola e em
Cuba. Nesse momento, é necessário destacar que, durante os
governos do PT, o BNDES foi, paulatinamente, sendo convertido em um instrumento
de operação de política externa, afagando com dinheiro tirado do nosso bolso
aliados ideológicos dos petistas em governos de pouca ou nenhuma democracia,
como Cuba e Angola. Financiar infraestrutura em outros países nunca foi intuito
do banco de fomento, uma empresa pública federal criada em 1952 com recursos
públicos brasileiros e americanos (estes, provenientes do Eximbank, uma
instituição destinada a desenvolver projetos de fomento no exterior), na
esteira dos trabalhos da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, colaboração
binacional com o intuito primordial de identificar e remover entraves de
infraestrutura ao desenvolvimento econômico (à época, era apenas BNDE) do
Brasil, fato que tem sido convenientemente omitido recentemente.
O fato torna-se ainda mais
inusitado quando se tem acesso ao total de financiamento disponibilizado pelo
BNDES para o exterior – nosso dinheiro, diga-se novamente – durante o ano de
2012: 2,2 bilhões de dólares para 15 países. Interessante notar que Cuba e
Angola, sozinhas, respondem por mais de 40 % do total. Eis o que Fernando
Pimentel, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior fez semana
passada: tornou secretos por 25 anos (ou seja, até 2027) todos os documentos
referentes às operações de financiamento para Cuba e para Angola – neste país,
o volume já aprovado de financiamentos supera os 10 bilhões de reais (US$ 5,2
bilhões). A justificativa de Pimentel para o segredo não deixa a dever ao “nada
de extraordinário” com que definiu seus questionados 2 milhões de reais em
consultorias: o Brasil possui “memorandos de entendimento” com as duas
ditaduras. Certamente, a dinastia Castro, que controla Cuba desde 1959, e José
Eduardo dos Santos, que controla Angola desde 1979, aprovariam com louvor a
medida, mesmo porque não se espera transparência nem dos governos deles nem das
fortunas ilegais deles: basta lembrar que os Irmãos Castro possuem uma fortuna
ilegal estimada pela Forbes em 900 milhões de dólares e que Isabel dos Santos,
filha de José Eduardo dos Santos que abriu um restaurante em Luanda em 1997 e
hoje possui um inexplicável bilhão de dólares, o que a coloca como a mulher
mais rica da África. Todavia, no que tange ao governo do Brasil, não apenas se
espera transparência, como também se exige legalmente por meio da Lei de Acesso
à Informação.
Assim, chegamos à patética
conclusão segundo a qual, uma vez que o governo brasileiro tem a prerrogativa
de tirar dinheiro de nosso bolso para ajudar os ditadores de Cuba e de Angola,
operação absolutamente legal conquanto de moral questionável, ao menos a nós, o
povo brasileiro, deveria ser facultado saber tudo o que aconteceu com nosso
dinheiro. Em outras palavras: uma vez que o governo legitimamente eleito é do
PT e uma vez que parece ser parte indelével do DNA do PT bajular tiranos, que
ao menos possamos acompanhar e rastrear todo e cada centavo do nosso dinheiro
para termos a certeza de que não foi usado para enriquecer ainda mais os
ditadores de plantão. Se a decisão do nosso governo sobre o destino do nosso
dinheiro, tirado dos nossos bolsos por meio de impostos estupidamente elevados,
não é investir na nossa precária infraestrutura, mas sim investir nas também
precárias infraestruturas de Angola e de Cuba, então que tudo seja
absolutamente transparente, como preconiza a Lei do Acesso à Informação,
porque, pior que nosso dinheiro não melhorar nossa vida aqui, é nosso dinheiro
melhorar apenas a vida dos ditadores de Angola e de Cuba. Fernando Pimentel, o homem
que foi inocentado pela Comissão de Ética da Presidência da República porque
seus 2 milhões não foram considerados “nada de extraordinário”, conseguiu, no
comando do MDIC, rasgar a Lei de Acesso à Informação, conquista árdua da
sociedade brasileira, e se igualar a ditadores do porte dos Irmãos Castro e de
José Eduardo dos Santos ao tornar secreto nosso dinheiro para Angola e Cuba. Se
algum dia isso também não for “nada de extraordinário”, não sei mais o que
poderia sê-lo.
Pedro Nascimento Araujo é economista.
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