A GRANDE REVOLUÇÃO
SERÍAMOS
muitos milhões, quando chegasse a noite. Como eu, enorme quantidade de soldados,
dada a ordem definitiva, silenciosamente, celeremente, atravessaria o grande
túnel e se lançaria à luta no desconhecido.
Nunca,
nenhum de nós tinha estado ali, naquele campo inóspito e perigoso. Sim, aquilo
era o que mais me causava espécie e intranquilidade; nunca se tinha tido
qualquer informação concreta sobre a guerra que iríamos travar, os obstáculos,
as armadilhas, as armas dos inimigos. Por que haveria tanto ódio? Se
nunca nos tínhamos avistado, se as derrotas que sobreviriam no final iriam
beneficiar a qualquer lado eram desconhecidas, que critério seria usado para
que se decretasse o vencedor? Aliás, naquele caso, especificamente, como seria
possível apontar esse ou aquele lado mais merecedor da vitória final? Sei, não.
Nem me interessava. Eu era apenas um soldado, seria mais um combatente logo
mais. E, a combatentes, resta combater o bom combate. Se, ao final, me esperava
o pódio, a coroa de louros dos heróis, a medalha reluzente, os aplausos, ou a
indiferença de uma plateia apática e sonolenta, não me interessava. Meu intuito
era a luta. Não ser o segundo para ninguém. Seríamos muitos milhões, quando
chegasse a noite. Talvez alguns poucos, como eu, também pensassem sobre o que
viria depois. Mas a grande maioria de nós nem se importassem com aquilo. A
noite chegaria. Ou a saída de carro. Ou o banho de mar. Ou o banheiro apertado
de um avião, uma cama macia de um motel, sei lá! As luzes verdes se iriam
acender. As pulsações rítmicas das paredes da minha casa se acelerariam. As
passagens se alargariam, e nós, que fomos criados obedientes e instintivos, nos
acotovelaríamos na ânsia da primeira e última viagem. Somente a um de nós
estava reservada a glória, a vitória. Todos os outros, dos
incontáveis guerreiros das profundezas morreriam tentando. Apenas um de nós
dentre os bilhões de espermatozoides que éramos no início, sobreviveria enfim, chegaria
a ser gente!
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