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Chechaquos




Por Pedro Nascimento Araujo

O Alaska não é o lugar mais simples do mundo para um recém-chegado. A extensão de terra por onde, durante a última Era do Gelo, os humanos cruzaram um congelado Estreito de Bering e chegaram à América, é inóspita. Comprado dos russos em 1867, o maior e menos populoso dos 50 estados americanos (não chega a 1 milhão de habitantes) tem um clima de extremos: 100 graus Celsius separam a maior (38 graus positivos) e a menor (62 graus negativos) temperaturas já registradas ali. Decididamente, não é um lugar para novatos: no Alaska, há uma palavra específica para nomear os calouros da terra: chechaquos, termo do dialeto da tribo Chinook que, literalmente, significa recém-chegado. A filiação de Marina Silva ao PSB e sua disposição de ser candidata a vice-presidente na chapa encabeçada por Eduardo Campos, na undécima hora, tornou o mundo político a maior concentração de chechaquos do Brasil: absolutamente ninguém antecipou a manobra.

Potencialmente, as implicações da aliança entre Marina Silva e Eduardo Campos são enormes. Eles, em si, não são chechaquos: Campos é governador de Pernambuco, estado onde fez sua carreira política seguindo os passos de seu avô, Miguel Arraes, e Silva, acreana, foi senadora e ministra de Lula da Silva. A união deles, todavia, foi uma bomba no mundo político: pela primeira vez em 20 anos, PT e PSDB não protagonizarão a disputa presidencial sozinhos – haverá uma 3ª Via. E deve ser competitiva. Dilma Rousseff vai enfrentar uma dupla que passa a contar com a popularidade de Marina Silva, que abarcou 20 milhões de votos em 2010. O primeiro efeito da parceria foi adicionar capilaridade eleitoral a um candidato que tinha como ponto fraco o desconhecimento dos eleitores de fora do Nordeste. Na verdade, a complementaridade entre Marina Silva e Eduardo Campos é maior: ela é mais conhecida no Centro-Sul (reduto do PSDB de Aécio Neves), ao passo que ele é mais conhecido no Norte-Nordeste (reduto do PT de Dilma Rousseff). Este fator torna a dupla altamente competitiva – especialmente em um cenário no qual os demais candidatos estão enfraquecidos.

Dilma Rousseff não tem o carisma de Lula da Silva e, principalmente, não teve a sorte de presidir o Brasil em um período de tamanha expansão mundial como seu antecessor: poucas vezes, as expressões céu de brigadeiro e mar de almirante foram tão apropriadas para definir um período de expansão da economia mundial como os anos dos mandatos de Lula da Silva. Na prática, sob Rousseff, a economia do Brasil tem um desempenho comparável ao do início da década de 1990, quando Collor de Mello presidia o país. Os protestos do Junho de 2013 atingiram fortemente a popularidade de Rousseff. Por fim, seu estilo político de concentrar poder no PT sem afagar os partidos aliados a levou a acumular partidários ressentidos, que sabem não poder correr para Aécio Neves, mas olham para a dupla Campos/Silva como uma ótima oportunidade para ter mais espaço em um eventual governo do PSB. Por outro lado, Neves será candidato de um partido que perdeu sua capacidade de defender suas posições e seu legado: o PT simplesmente apropriou-se de suas bandeiras e conseguiu, aos olhos dos eleitores, destruir seu legado. Não que o PSDB não tenha culpa disso: a patética aparição de Alkmin, então candidato à Presidência da República, vestido como um mecânico de uma equipe de Stock Car com propagandas de empresas estatais diz muito sobre um partido envergonhado de seu sucesso e que encampou a propaganda do adversário. Some-se a isso as disputas fraticidas (José Serra definiu apenas no último dia sua permanência no PSDB, mas ninguém aposta que ele fará o menor esforço para ajudar Neves) e a falta de renovação (Neves, Serra e Alkmin: desde que Fernando Henrique Cardoso foi eleito em 1994, os expoentes do partido são os mesmos) e entende-se facilmente que Neves terá sérios problemas para enfrentar a dupla Campos/Silva, que competirá com ele pelo mesmo eleitor que acha que o PT já ficou tempo demais no poder.

Chegamos, portanto, ao ponto principal: a dupla Campos/Silva foi parte dos governos do PT. É uma oposição doméstica. Pode ser facilmente entendida pelos eleitores como uma correção de rumo, não uma ruptura com o PT. Ou seja, a dupla pode, ao menos em tese, se beneficiar tanto dos votos oposicionistas (eleitores que não querem o PT de jeito nenhum) quanto dos votos continuístas (eleitores que acham que o PT não está fazendo um bom governo, mas não querem o PSDB de jeito nenhum). É simples: enquanto Neves e o PSDB são oposição desde 2003, Campos é oposição apenas desde 2013. Simplesmente, não será possível a Rousseff atribuir à nova chapa a pecha de polo oposto ao PT: esse lugar é do PSDB, e tentar transferir isso para Campos/Silva significaria fortalecer Neves – ainda mais quando se sabe haver um acordo de resseguro entre Campos e Neves que ambos parecem sinceramente dispostos a honrar em um eventual segundo turno contra Rousseff. Por outro lado, a dupla também não pode ser tachada como polo oposto do PSDB: o PT ocupa esse papel. Com o tempo e involuntariamente, a dicotomia maniqueísta PT-PSDB, que domina o debate presidencial há duas décadas, tornou-se uma armadilha para seus protagonistas. Demorou 20 anos, mas a 3ª Via finalmente surgiu e é viável: no mundo político, todos agiram como chechaquos – ninguém percebeu sua chegada.

Pedro Nascimento Araujo é economista  

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