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Bernard Shaw e a maioria de circunstância




Por Pedro Nascimento Araujo

Que o irlandês George Bernard Shaw era genial – foi agraciado com o Prêmio Nobel de literatura em 1925 e com o Oscar em 1938 – é ponto pacífico, mas ele era mais conhecido por seu humor ácido nos salões vitorianos. Dentre as muitas pérolas atribuídas a ele, há um suposto diálogo travado com uma dama da sociedade britânica: querendo provar que qualquer pessoa estaria disposta a fazer qualquer coisa dependendo do preço, ele perguntou se ela aceitaria fazer sexo com ele por um milhão de libras. Relutante, ela concordou que por esse valor poderia aceitar. Ele, então, refez a pergunta, mas oferecendo apenas 10 libras pela noite. Indignada, a senhora perguntou a Shaw se ele pensava que ela era uma prostituta. A resposta: “o que a senhora é já ficou claro na primeira oferta; como cliente, estou apenas regateando o preço!” Embora a origem da citação seja incerta (diálogos semelhantes são atribuídos a outros notórios autores de pilhérias, como Sir Winston Churchill ou Groucho Marx), o destino é certo: a absolvição dos condenados do Mensalão pelo crime de formação de quadrilha por meio do que Joaquim Barbosa chamou “maioria de circunstância” – por mais que a pena mude, aquilo que os mensaleiros são já ficou claro na primeira condenação.

A fala e atitude de Barbosa ao comentar a mudança de posição do Supremo Tribunal Federal geraram polêmicas, especialmente ao declarar que a absolvição dos mensaleiros mais graduados quanto à formação de quadrilha seria apenas o “primeiro passo” da “sanha reformadora” de uma “maioria de circunstância”. Das duas, uma: ou são acusações por demais sérias para ser ignoradas ou são resultado de um discurso político de circunstância do próprio Joaquim Barbosa e, portanto, não apenas não são sérias como também são inúteis e servem apenas para diminuir o Supremo Tribunal Federal. Infelizmente, não há como saber ainda – embora Joaquim Barbosa garanta que não será candidato a nada neste ano, ele pode mudar de ideia até abril. O fato de os votos dos chamados “novatos” (termo deselegante e pejorativo, foi usado por ministros do STF para falar de Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki) descaracterizar a formação de quadrilha por parte dos mensaleiros é relevante, mas, retornando a Bernard Shaw: os mensaleiros são criminosos e continuarão presos – se por formação de quadrilha e corrupção ou apenas formação de quadrilha, é apenas o equivalente ao preço a ser paga para a senhora da anedota. Porém, a mera perspectiva de uma partidarização do STF é apavorante.

A acusação de Barbosa é fundada nos “novatos” terem reformado a decisão anterior do STF a respeito do crime de formação de quadrilha no Mensalão. Convenientemente, Barbosa se esqueceu de mencionar que outros quatro ministros também entenderam não ter sido caracterizado o crime em tela. Ministros do STF são indicações do Poder Executivo referendas pelo Poder Legislativo (Senado). O fato de dois poderes escolherem os membros do mais elevado escalão do terceiro é parte do sistema de pesos e contrapesos do princípio de igualdade e separação de poderes conforme definido por Montesquieu (curiosamente, no modelo inglês, inspiração do filósofo francês, o Poder Executivo é subordinado ao Poder Legislativo). Assim, Barbosa, ao falar em “sanha reformadora” no Poder Judiciário, acusa não apenas seus colegas, como também os demais poderes. É um discurso perigoso se não estiver perfeitamente embasado. Se Joaquim Barbosa falou com o fígado, errou e deve pedir desculpas aos seus pares no seu Poder e aos demais Poderes pelo disparate; todavia, se Joaquim Barbosa estiver certo e o STF, por conta da chamada “maioria de circunstância”, começar a “sanha reformadora” para fazer o Brasil regredir no combate à corrupção ( cujo marco maior é exatamente o fato de José Dirceu, um ex-futuro Presidente da República, estar preso por conta do trabalho de Joaquim Barbosa no Mensalão), a democracia brasileira estará em risco. Vigiai e orai. Quanto ao Mensalão em si, já sabemos o que foi: um esquema de corrupção para financiar a hegemonia do PT – e mudar a pena não altera esse fato, como diria Bernard Shaw.

Pedro Nascimento Araujo é economista.

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