Por
Pedro Nascimento Araujo
O aumento de 160% no Fundo
Partidário é uma ação de mau gosto e sem graça. De mau gosto porque é mais um
aumento de impostos nos combalidos bolsos dos pagadores de impostos brasileiros
(que são chamados “contribuintes”, como se as impostos fossem voluntários) e
sem graça porque ocorre em um momento no qual há cortes de gastos
governamentais. A decisão, que não apenas isenta a classe política do corte de
gastos como ainda aumenta a dotação orçamentária dela, passa para a sociedade a
inequívoca certeza de que Brasília não a respeita. Como se pôde chegar a uma
medida tão desastrosa, todavia, é muito interessante: não se faz algo tão
simbolicamente carregado sozinho; afinal, cúmplices são necessários para tudo o
que é ilegal, imoral e engorda, como transformar partidos políticos em
barnabés; ou melhor, em marajás.
A promiscuidade entre o dinheiro
dos pagadores de impostos e o bolso dos partidos políticos não começou com os
governos do Partido dos Trabalhadores (PT). Embora o PT seja o maior entusiasta
do financiamento público exclusivo para as campanhas políticas, quem
transformou uma letra firme o financiamento público foi o primeiro governo de
Fernando Henrique Cardoso. Em 1995, o então Presidente da República sancionou a
Lei 9096, mais conhecida como Lei dos Partidos Políticos. O Artigo 30 da
referida lei trata exatamente da formação do Fundo Partidário. Além de
estabelecer o que já se aplicava até então (desde a promulgação da Constituição
de 1988, as arrecadações em multas da Justiça Eleitoral formavam o Fundo
Partidário, que passaria a poder receber também outros recursos que viessem a
ser previstos em lei), o Artigo 38 da Lei 9096 inovou em seu Inciso IV, que
falava em “dotações orçamentárias da União em valor nunca inferior, cada ano,
ao número de eleitores inscritos em 31 de dezembro do ano anterior ao da
proposta orçamentária, multiplicados por trinta e cinco centavos de real, em
valores de agosto de 1995.” Estava feito o estrago: os cofres públicos
passariam desde 1996 a bancar os partidos políticos. Há duas décadas, portanto,
os partidos políticos viraram barnabés (termo surgido de um samba de Haroldo
Barbosa e Antônio Almeida em 1947, barnabé é sinônimo dicionarizado de
funcionário público), com vencimentos previstos em lei e impossíveis de
afastar. A favor de Fernando Henrique Cardoso, diga-se que ele vetou dois
parágrafos ainda mais imorais e engordativos: o § 1º falava em dobrar o Fundo
Partidário em todos os anos nos quais houvesse eleição – na prática, um aumento
efetivo de 50%, dado que há eleições bianualmente no Brasil – e o § 2º falava
em deduções no Imposto de Renda das doações a partidos políticos tanto de
pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas; além disso, vetou itens como o
Artigos 50 e 52, que previam isenção tributária para os partidos políticos,
inclusive sobre renda e patrimônio. Ou seja, a Lei dos Partidos Políticos
poderia ser ainda pior.
O PT, que sempre defendeu o
financiamento público integral para as campanhas políticas, não moveu uma palha
para alterar a Lei dos Partidos Políticos. O resultado dessa ópera bufa não
poderia ser outro além do atual: diante de uma Presidência da República
aleijada pela já lendária incompetência política de sua titular, os
profissionais do Congresso Nacional conseguiram quase triplicar o que sai dos
nossos bolsos diretamente para os bolsos dos partidos políticos que eles
comandam. Em um ano de ajustes fiscais, nenhum barnabé comum pode esperar
aumento de seus vencimentos. Mas há barnabés e barnabés: nessa segunda
categoria, estão os marajás (o termo foi popularizado por um aliado do governo,
o ex-presidente Fernando Collor de Mello, quando ele ainda era governador de
Alagoas e, segundo o Houaiss, quer dizer “funcionário público ou de empresa
pública cujo salário e demais vantagens são exorbitantemente altos”). E os
marajás sempre podem esperar aumento dos seus vencimentos – por definição.
Assim, enquanto pela Lei 9096 Fernando Henrique Cardoso transformou os partidos
políticos em barnabés, pelo Orçamento de 2015 Dilma Rousseff os fez marajás.
Pedro Nascimento Araujo é
economista.
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