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Bem-vindas, Metas de Desenvolvimento Sustentável. Por Pedro Nascimento Araujo


A Organização das Nações Unidas é um microcosmo das organizações humanas. Lá, podemos encontrar tudo o que há de bom e de ruim o gênio humano é capaz de conceber. Pelo lado bom, há avanços notáveis. Um deles foi em 2000, com a instituição das chamadas Metas de Desenvolvimento do Milênio, mais conhecidas simplesmente como Metas do Milênio. Eram exatamente oito, e atacavam temas muito importantes: 

1, Acabar com a fome e a miséria; 

2, Educação básica de qualidade para todos; 

3, Igualdade entre sexos e valorização da mulher; 

4, Reduzir a mortalidade infantil; 

5, Melhorar a saúde da gestante; 

6, Combater a aids, a malária e outras doenças; 

7, Qualidade de vida e respeito ao meio-ambiente; e 

8, Todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento. 

Para países como o Brasil, não havia coisa alguma de extraordinário nessas metas. São temas que o Itamaraty tradicionalmente defende nos fóruns internacionais, dos quais o principal é a própria ONU. Para outros países, poderia haver um ou outro constrangimento, especialmente em relação a direitos das mulheres ou combate à aids, mas nada que impossibilitasse a adesão às Metas do Milênio – até porque, deliberadamente, elas eram foram apresentadas de forma extremamente amplas, a adesão era voluntária e caberia a cada país transformá-las em políticas públicas: é difícil que um país se posicione contra uma agenda dessas, e, nem tão paradoxalmente quanto poderia parecer, os maiores tiranos gostam de posar como defensores de bons valores na cena internacional. Uma década e meia depois, pode-se dizer que os Objetivos do Milênio foram um sucesso em seu todo, embora notemos discrepâncias grandes em termos de resultados individuais. Evidentemente, ainda há problemas em cada uma delas, mas há destaques primorosos, como a redução pela metade do número de pessoas em situação de fome e miséria – é verdade que grande parte disso ocorreu em função do crescimento na China, mas o sucesso é inegável: a missão das Metas do Milênio foi cumprida sem maiores percalços e a humanidade como um todo progrediu, embora seja difícil perceber isso quando se está imerso nas grandes questões do cotidiano. Portanto, é hora de felicitar as Metas do Milênio pelo conjunto da obra e conhecer as Metas de Desenvolvimento Sustentável.

Com o sucesso das Metas do Milênio, a ONU resolveu acertadamente dobrar a aposta: nas Metas de Desenvolvimento Sustentável, serão 17 os itens. Inevitavelmente, as Metas de Desenvolvimento Sustentável sofrem as mesmas críticas que as Metas do Milênio sofreu: objetivos muito amplos, adoção voluntária, falta de mecanismo de controle e punição etc. São preocupações válidas, porém algo pueris. Os países simplesmente não aceitariam submeter-se a controle externo em áreas tão vitais de suas políticas internas, e os críticos parecem ignorar isso deliberadamente. As metas são amplas de propósito, as adoções serem discricionárias é uma estratégia de facilitar a adesão e a ausência de controle externo é o preço a se pagar para que virtualmente todos os 193 membros da ONU venham a aceitar as Metas de Desenvolvimento Sustentável. Aliás, o momento de adoção delas não poderia ser mais preciso: na sexta-feira, o papa Francisco vai falar na ONU e, após a fala dele, começarão as reuniões finais para que a 70ª Assembleia Geral das Nações Unidas, que começa na segunda-feira 28, já comece com a adoção do documento. Espera-se que mais de 150 chefes de estado se reúnam em uma cúpula após a fala de Francisco, incluindo peso-pesados como Barack Obama e Xi Jinping, para aparar as arestas finais. Será um daqueles momentos únicos na história humana, na qual a quase totalidade das nações (simplesmente, não há como se prever o que farão estados como a Coreia do Norte ou a Síria) se reúne para assumir um compromisso inequívoco com o desenvolvimento sustentável, ainda que carente de metas vinculantes etc.

Um dos pontos mais interessantes a se notar nas Metas de Desenvolvimento Sustentável é que elas suplantam a lógica de conflito Norte-Sul, sendo Norte metonímia para os países desenvolvidos e Sul metonímia para os demais. Esse ponto merece muito destaque: nas Metas de Desenvolvimento Sustentável, há a cooperação Norte-Sul. Para a diplomacia nacional, isso significa que a cooperação Sul-Sul talvez não venha a ser mais o ponto focal nas próximas décadas, o que certamente ensejará intermináveis debates no Itamaraty, mas, para o mundo, há uma transcendência maior. Explica-se. O custo mundial estimado para se atingir as Metas de Desenvolvimento Sustentável em 15 anos (criatividade não é exatamente um artigo abundante na ONU: resolveram repetir o prazo que as Metas do Milênio tiveram) chega a 5 trilhões de dólares por ano até 2030– mais do que o dobro do combalido PIB do Brasil. Não é pouco sob hipótese alguma. Por isso, nas amplas negociações que antecederam o lançamento das Metas de Desenvolvimento Sustentável (e das quais o Brasil lamentavelmente só não participou mais por deficiências orçamentárias), países do Norte e do Sul perceberam que o modelo no qual este quer que aquele pague tudo baseado em questionáveis “responsabilidades históricas” estava exaurido. É uma diferença gritante em relação às antigas Metas do Milênio, nas quais prevalecia a ideia de um Norte financiando o desenvolvimento do Sul. Aponta para um mundo mais colaborativo, que parece caminhar no sentido de superar a lógica de conflito entre países desenvolvidos, herdada do Século XX, por uma lógica de colaboração em prol do desenvolvimento da humanidade. Não é pouca coisa: colocar o desenvolvimento humano acima das disputas políticas das nações é o primeiro grande feito das Metas de Desenvolvimento Sustentável, alcançado antes mesmo de elas serem adotadas. Sejam bem-vindas, e que venham muitos outros!


Pedro Nascimento Araujo é economista.

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