Qual homem se arvorará a manusear
os apetrechos de uma bolsa feminina, totalmente livre e desprovido da
insistente autocensura? Nenhum! Mesmo que elas a permitam, o nosso outro lado
feminino, ainda uma mera desconhecida, ficará a nos vigiar como se estivéssemos
cometendo um sacrilégio, pelo simples fato de termos que nos deparar com algo
que não deverá ser visto. Não há intimidade que permita tal abuso. A bolsa
feminina é mais insondável do que as liberdades que ao seu corpo permite. E nem
sei qual delas é mais acessível se a sua bolsa ou a sua alma.
Para nós, pretensos seres, antes,
repletos de um histórico poder e vivendo o ocaso dessa envergadura (com
trocadilho, por favor), foi-nos a época em que essa plenipotência nos dava o
direito de vasculhar delas o que quiséssemos. Temos toda a liberdade de
manusear os mais recônditos lugares do seu corpo e do seu coração, mas nenhuma
liberdade de chafurdar a sua bolsa. É como se estivéssemos metendo bedelho onde
nunca seremos chamados.
Nós, cenógrafos, costumamos criar
e desenhar objetos procurando seus signos e suas formas para um dia o
colocarmos em prática. Imaginem um número de dança ou um enredo de escola de
samba, só mostrando a relação entre a mulher e a sua bolsa. Não será preciso
palavras... Esse objeto corriqueiro nos traz divagações com ampla carga
simbólica. Desde quando elas saem de casa com os seus alforjes, checando o seu
conteúdo; as coisas que tiram e colocam de volta; as suas aflições quando não
sabem onde está o que procura; como a põe e os joga na mesa á procura do objeto
perdido; como a utiliza como proteção, apertando-a contra o peito e quando a
sustentam como um fardo.
Além de servir à sua função
explicita - que é a de guardar e carregar objetos indispensáveis do cotidiano
feminino - a bolsa demonstra que também pode simbolizar o peso da sua vida. Se
Freud estivesse vivo, para estudar esse universo, hoje em dia, teria muito a
dizer dessa mulher na relação orgânica com a sua bolsa. Essa junção seria uma
fonte inesgotável de pesquisa para as suas teorias analíticas.
Para nós, a bolsa feminina pode
ser considerada um microcosmo desse mundo cheio de obrigações e peso. Dentro de
cada bolsa feminina reside uma miniatura da sua própria casa. Tudo que seja
necessário para sobreviver no dia a dia, estão ali contidos. Tanto os objetos
das necessidades básicas, como escova de cabelo, agenda, um lenço, um
comestível qualquer, uma calcinha, absorvente etc. Na verdade, berloques sem
nenhuma aparente utilidade prática são indispensáveis para a sua segurança.
Enfim, a bolsa de uma mulher
não é igual à nossa bolsa. Ela é muito mais de que uma portadora de objetos que
servirão ao seu dia a dia ou à sua vaidade. Ela é o seu útero portátil, recheado
de pequenas lembranças afetivas e recordações das quais tem dificuldades de
esquecer. Por isso as carrega, expurgando o supérfluo na próxima faxina. E
hoje, a bolsa das mulheres também porta documentos, processos... Virgem, Maria!
Pelo apego umbilical com que se agarra à sua bolsa doméstica, qual será o grau
de aderência com as recheadas de processos e negócios na disputa acirrada do
mercado? Lógico, que se for com a mesma intensidade: vencerão. Talvez seja por
isso que aquele nosso tão esquecido, relegado e desconhecido “lado” nos contém
e nos reprime quando nos aventuramos a mexer em uma bolsa feminina.
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