Por Pedro Nascimento Araujo
Atende por “Nota à sociedade
brasileira” um dos documentos mais surreais já apresentados. Com assinatura e
liderança de Rui Falcão, presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), a nota
traz ainda as firmas de Eduardo Campos (PSB), Valdir Raupp (PMDB), Renato
Rabelo (PCdoB), Carlos Lupi (PDT) e Marcos Pereira (PRB). Com exceção do
peemedebista Raupp, que no melhor estilo Bill Clinton (perguntado se já havia
consumido marijuana, o então candidato a presidente americano respondeu “fumei,
mas não traguei”), disse que não leu e foi coagido a assinar, mas não retirou a
assinatura, os demais se limitaram ou a tentar reduzir os danos (Campos disse
que essa versão, teoricamente a quarta, era “muito melhor” que as primeiras) ou
a manter um constrangedor silêncio. De concreto, o documento deixa uma dúvida
no ar: ou o PT vive em um universo paralelo, que descreverei a seguir, ou seus
dirigentes pensam que a sociedade brasileira, ao contrário do que afirma
Clinton, fuma e traga muito.
Ao afirmar que a oposição tenta
“pressiona o STF”, a nota do PT lança suspeitas sobre a lisura da mais alta
corte do Poder Judiciário. Ao afirmar que o Mensalão (ao qual a nota,
sintomaticamente, se refere como “Ação Penal 470”) é “um julgamento
político, para golpear a democracia e reverter as conquistas que marcaram a
gestão do presidente Lula”, o comando do PT, no mínimo, delira. Na verdade, o
comando do PT está preocupado com os riscos de, após a cada vez mais provável
condenação penal de suas estrelas de primeira grandeza (dentre as quais se
sobressai José Dirceu, a pessoa que urdiu o “Lulinha Paz e Amor” e que estava
sendo preparado para sucedê-lo na presidência do Brasil) por parte do STF, ver
Lula da Silva, estrela-mor do partido, réu em um processo penal como comandante
do Mensalão.
A arrogância é um componente tão
petista quanto a estrela vermelha emprestada dos soviéticos que os petistas
exibem na lapela. Pena, porque o Mensalão poderia ter sido o momento de o
partido recriar-se, expurgando os que compactuam com corrupção de seus quadros.
Sua histórica militância merecia isso. Mais ainda, o Brasil só teria a ganhar
com um novo PT, firme na defesa dos valores republicanos, poderia ter nascido
dessas cinzas nefastas. Infelizmente, não foi o que ocorreu. A arrogância, como
sempre, prevaleceu: o comando do PT acha que ninguém no partido errou – João
Paulo Cunha, José Genoíno e José Dirceu, dentre outros, não apenas não foram
expulsos do PT, ao contrário do que ocorreu em outras agremiações (José Arruda,
governador cassado do DF, foi expulso do Democratas), como continuaram ocupando
altos cargos no partido. E, no comando do PT, geram documentos constrangedores
para sua militância como a “Nota à sociedade brasileira”.
A sociedade brasileira está
sóbria e firme na defesa dos valores republicanos, assim como a maioria da
militância do PT. O comando do PT, contudo, vive em outro universo, no qual
nenhum dos seus erra – e, se são apanhados pela Justiça, não é porque erraram,
mas sim porque a oposição que “golpear” o PT. Esse descompasso entre universos
faz com que o partido humilhe sua militância através de atitudes como a “Nota à
sociedade brasileira”. Os militantes do PT, majoritariamente pessoas bem
intencionadas, não concordam com a “Nota à sociedade brasileira” criada por
Falcão. Eles querem seu partido de volta, defendendo os melhores valores
republicanos – aqueles que estão acima de diferenças político-ideológicas, como
a honestidade e o respeito à coisa pública. Para o bem da sociedade brasileira,
esses militantes merecem o respeito de todos.
Pedro Nascimento Araujo é
economista.
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