Por Pedro Nascimento Araujo
Em 1999, na esteira da quebra da
maxidesvalorização do real, o país adotou o chamado Tripé Macroeconômico: metas
de inflação, metas de superávit primário e câmbio flutuante. Com esse modelo, o
Brasil cresceu com inflação baixa e finanças públicas controladas. Em 2012, o
desmonte deste sistema atingiu um novo ápice, com inflação perigosamente alta,
câmbio deliberadamente elevado e superávits primários mantidos graças a
malabarismos contábeis. Senão, vejamos.
Comecemos pela inflação. Depois
da hiperinflação dos anos 1980, o Plano Real conseguiu, em 1994, trazer as
taxas para patamares menores. A principal característica desse sistema era
contar com um câmbio desvalorizado (a chamada Âncora Cambial) que pressionava
pela baixa dos preços por intermédio das importações. Assim, sempre que alguém
quisesse comprar dólares, o Banco Central do Brasil (BACEN) vendia suas
reservas e mantinha o câmbio fixo. Evidentemente, quando começou a ficar claro
para o mercado que faltariam dólares nas reservas da autoridade monetária para
vender dólares a custo fixo para todos os agentes, a especulação cresceu e
ficou impossível manter a cotação do câmbio fixa, resultando na
maxidesvalorização.
Em 1999, o país foi forçado a
flexibilizar o câmbio após o fracasso da a patética e efêmera (2 semanas)
“Banda Diagonal Endógena” de Francisco Lopes. Desde então, segue-se o modelo
trazido ao Brasil por Armínio Fraga: as metas de inflação. Desde então, a
inflação anual passou a ter metas anunciadas com antecedência. Caso o BACEN
exceda o teto da meta, que, malgrado ser de generosos 2% acima do centro da
meta (ou seja, para um centro da meta de 4%, estamos falando de uma tolerância
de 50%) para ser atingida demandou malabarismos que evocam os piores anos da
hiperinflação. Um exemplo didático é a Petrobras e seus acionistas sendo
obrigados a amargar prejuízos nas vendas de combustíveis para que a inflação
não ultrapasse o teto – e, com isso, Alexandre Tombini não tenha de se explicar
ao Senado. Sem essas ações, a inflação estouraria o teto da meta. Com as
manobras, ao menos formalmente a meta de inflação foi cumprida. O custo? A
primeira perna está bamba.
Quanto às metas de superávit
primário, os malabarismos são ainda mais evidentes. A Petrobras entrou de novo
na dança. Importações de petróleo e de combustíveis feitas em 2012 foram
jogadas para as contas de 2013. O Tesouro Nacional promoveu pouco ortodoxas
manobras envolvendo Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social, além de recursos de obras
governamentais, para passar a impressão de que a meta de superávit primário foi
cumprida. Infelizmente, simplesmente não foi, embora, para todos os efeitos, o
governo garante que foi. A segunda perna está claudicante.
Por fim, há o câmbio. Flexível em
sua concepção como parte do Tripé Macroeconômico, o câmbio vem sendo
deliberadamente desvalorizado para que, por meio de dumping cambial reativo, o
Brasil aumente a competitividade de exportadores brasileiros – os únicos
beneficiados por tal contexto. Isso, além de pressionar a inflação e prejudicar
tanto a modernização do parque industrial brasileiro quanto os consumidores que
acabam pagando mais caro por insumos importados, gera ineficiência e
insegurança no mercado. Em Formação Econômica do Brasil, Celso Furtado,
citando o dinheiro público gasto na Primeira República para manter a
rentabilidade dos exportadores de café , cunhou a expressão “socialização da
perdas” para aludir ao fato de que, na prática, quem paga pelos privilégios dos
exportadores é a coletividade. Nada mais atual, embora, formalmente, o câmbio
seja fixo, mais ou menos como no mítico Ford T que, segundo Henry Ford, era
vendido em quaisquer cores que o cliente quisesse desde que fosse preto. A
terceira perna está coxeando.
Com suas três pernas
manquitolando, não é possível precisar por quanto tempo o Tripé Macroeconômico
seguirá sustentar-se de pé para manter as aparências. O que mais preocupa,
contudo, não é o caráter claudicante do Tripé: é não saber que modelo o governo
Dilma Rousseff pretende que o substitua se, após tropeçar tanto, finalmente o
trôpego Tripé Macroeconômico cair de vez – e levar consigo a popularidade da
presidente Dilma Rousseff.
Pedro Nascimento Araujo é
economista.
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