Por
Pedro Nascimento Araujo
Que o Petrolão vai dominar a
pauta política nacional por um bom tempo, ninguém duvida. Também parece ser
ponto pacífico que as ramificações do esquema de corrupção são capazes de fazer
o Mensalão parecer assunto de juizado de pequenas causas, conforme a já célebre
definição de Gilmar Mendes, Ministro do Supremo Tribunal Federal. Quanto ao
potencial de incorrer em crime de responsabilidade para a Presidente da
República, ainda há controvérsias, embora o caso tenha uma base fortíssima:
Dilma Rousseff era Presidente do Conselho de Administração da Petrobras durante
o Petrolão, o que a coloca legalmente como passível de imputação por
responsabilidade solidária pelas decisões da Diretoria da empresa; na prática,
se a justiça decidir que houve crime nos casos de Pasadena, Abreu e Lima e
outros, ela pode virar ré – no caso, em um processo deimpeachment. Saindo da
pauta política, também é consenso que a Petrobras vai dominar a pauta econômica
por um bom tempo – e, de novo, pelos motivos menos nobres possíveis: desde
2010, o valor de mercado da Petrobras em dólares caiu mais de 70% (em reais,
foram 225 bilhões a menos nos bolsos dos seus acionistas). Se pudermos resumir
o que a Petrobras fez nos últimos anos em duas palavras, seriam corrupção
(Petrolão) e incompetência (perda de 70% do valor). Portanto, diante do ora
exposto, talvez seja melhor trocar o nome da empresa estatal de petróleo
brasileira de Petrobras (Petróleo Brasileiro S.A.) para PDBSA (Petróleos de
Brasil S.A.). Como, em espanhol, as letras “b” e “v” representam exatamente o
mesmo fonema, para os falantes da língua de Cervantes, PDVSA (Petróleos de
Venezuela S.A.) e PDBSA (Petróleos de Brasil S.A.) soarão idênticas, o que os
obrigará a fazer a seguinte pergunta: “Com ’b’ ou com ‘v’”? Pergunta pertinente
porque a PDBSA, perdão, a Petrobras, está cada vez mais indistinguível da
PDVSA. Vamos provar mostrando que dois pontos que até há poucos anos eram
insígnias da PDVSA – operações secretas e apoio ao populismo – agora fazem
também parte do cotidiano da Petrobras.
Comecemos pelas operações
secretas. Embora sejam oficialmente proibidas pela lei brasileira para uma
empresa de capital aberto, elas ocorrem na PDBSA, empresa cujo maior sócio é o
governo federal, exatamente quem mais deveria observar a lei. Na sede da PDBSA
(o nada criativamente apelidado EDISE, sigla de Edifício Sede), uma construção
inspirada em uma colmeia e com jardins suspensos no centro do Rio de Janeiro,
há uma sala secreta no 19º andar na qual a diretoria da empresa se reunia para
definir os preços de referência (preços mínimos e máximos para a contratação)
das obras do Petrolão. A sala era de uso exclusivo do corrupto confesso e
delator Paulo Roberto Costa (ou “Paulinho”, como Lula da Silva e Dilma Rousseff
se referiam a ele) durante o período em que esteve à frente da Diretoria de
Abastecimento e Refino. Na sala secreta, Costa comandava reuniões secretas nas
quais se decidiam os preços de referência secretos para os contratos do
Petrolão sem que nenhum especialista da companhia tomasse conhecimento – o que
fosse decidido ali, por mais exorbitante que fosse (e, obviamente, quase sempre
o era), seria legal para todos os efeitos. Roubalheira limpa,
institucionalizada, com todas as assinaturas nos devidos lugares – e que
roubalheira, diga-se: a Refinaria Abreu e Lima, que, caso a Petrobras passasse
mesmo a se chamar PDBSA, seria uma perfeita parceria-palíndromo em castelhano
(PDBSA-PDVSA) que já custou 10 vezes mais do que o previsto e ainda não está
pronta, deixando um rombo de mais de 20 bilhões de reais. Por sua vez, na PDVSA
há mais que reuniões secretas: há até mesmo voos secretos, como o que trouxe
clandestinamente para o Brasil no dia 24-Out-2014 um sujeito de nome Elías
Jaua, que vem a ser Ministro do Poder Popular para os Movimentos Sociais da
Venezuela – na prática, quem comanda as milícias armadas que dão “suporte” (eufemismo
para coerção) ao chavismo. Jaua veio clandestinamente para firmar um acordo de
“treinamento revolucionário” com o MST (algo que qualquer governo sério
consideraria uma inaceitável interferência em assuntos internos e convocaria de
imediato o embaixador da Venezuela para dar explicações, o que, evidentemente,
não ocorreu), mas seu plano logrou porque uma arma de fogo foi encontrada na
bagagem de mão da babá de seus filhos. Em suma, enquanto na PDBSA há reuniões
secretas em salas secretas nas quais se decidem falcatruas, na PDVSA há voos
particulares secretos, um deles para o Brasil. PDBSA e PDVSA atuam secretamente
e ao arrepio da lei. Semelhança 1, operações secretas: confere!
O apoio ao populismo é outro
traço comum à dupla PDBSA-PDVSA. Apenas para alternar a ordem, comecemos pela
empresa que tem “v baja” (a letra “B”, no idioma do Reino de Castela), a PDVSA.
Desde que o chavismo começou a saquear o caixa da PDVSA para financiar suas
ações populistas e, com isso, perpetuar-se no poder por meio da criação de
miseráveis, a estatal venezuelana já fez “doações” de mais de 60 bilhões de
dólares para programas como as Missões Bolivarianas, carro-chefe do populismo
chavista. Com isso, o dinheiro obtido com a exploração do ouro negro não é
revertido para o caixa da empresa (que, por sinal, como ficou sem recursos ou
créditos para explorar novas reservas e está, na prática, convocando sócios
estrangeiros em condições extremamente favoráveis a estes, como prova um acordo
firmado secretamente com a Chevron no ano passado, por meio do qual a gigante
americana adiantou dois bilhões de dólares e obteve como garantia em corte
arbitral internacional as receitas decorrentes da venda de óleo bruto da PDVSA
para os EUA, seu principal mercado), mas sim utilizado para financiar o
populismo. Poder-se-ia dizer que a empresa que tem “b alta” (a letra “B”, em
espanhol), a PDBSA, usa e abusa de seus patrocínios, notadamente na forma de
anúncios na imprensa, para sustentar amigos palacianos, mas isso não é
suficiente para se configurar apoio ao populismo; afinal, a PDBSA não paga
diretamente, por exemplo, por víveres para brasileiros. Porém, a PDBSA se
igualou à PDVSA ao subsidiar a gasolina, embora com diferenças fenomenais em
termos do tamanho dos subsídios: a PDVSA não aumenta o preço da gasolina desde
1996 – na Venezuela, a gasolina é a mais barata do mundo (a inflação galopante
ajudou muito a chegar nesse ponto: neste ano, deve ultrapassar os 75%) e, por
isso, há cada vez menos empresários dispostos a vender gasolina por uma margem
ridiculamente pequena. Eis a situação: o país que possui as maiores reservas de
petróleo do mundo confirmadas (300 bilhões de barris) convive com escassez de
gasolina. Como desgraça pouca é bobagem, ainda há uma patética cereja cambial
no bolo podre do populismo chavista: o amplo desperdício de gasolina,
estimulado pelo preço extremamente subsidiado, pressiona as já deveras
combalidas reservas cambiais do país: uma vez que o óleo ultrapesado extraído
na região do Orinoco é refinado no exterior, a gasolina desperdiçada na
Venezuela é importada. No Brasil, a PDBSA ainda não chegou a tanto: aqui, a
gasolina custa caro, mas custa menos caro do que deveria custar porque o
governo segura a inflação no teto da margem de tolerância da meta ao represar o
aumento dos combustíveis derivados do petróleo (gasolina e diesel, mas não
querosene de aviação: este tem o preço literalmente alinhado com o mercado
internacional e é cobrado em dólar) e, com isso, esconder sua incompetência no
combate à inflação. Em termos práticos, a brincadeira populista de Dilma
Rousseff já custou aos cofres da PDBSA mais de 60 bilhões de reais – e não há
sinais de arrefecimento nessa política, uma vez que o ajuste fiscal continua
sendo uma miragem e, com isso, o uso do caixa da PDBSA para financiar o
populismo deve continuar em alta. Semelhança 2, apoio ao populismo: confere!
Eis porque talvez seja interessante adotar logo o nome PDBSA: para não criar
falsas expectativas de que são empresas distintas, de que a estatal de petróleo
brasileira nem faz operações secretas nem financia o populismo, ao passo que a
estatal venezuelana de petróleo faz ambas as coisas – como vimos, ambas fazem
ambas as coisas, com a diferença de que a empresa caribenha as faz há mais
tempo e com mais intensidade. Assim, se optar por assumir o nome PDBSA, a
estatal brasileira poderá incorporar de vez a condição de prima-irmã da PDVSA
e, finalmente, poderá se dedicar tanto às operações secretas quanto às ações de
apoio ao populismo com muito mais desenvoltura; quem sabe, poderia começar
contratando como consultores expoentes da PDVSA – obviamente, contratos
superfaturados, comme il faut.
Pedro Nascimento Araujo é
economista.
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