Pedro Nascimento Araújo
A Suíça é um país peculiar: sem cacau, produz chocolates mundialmente famosos. Alías, produz relógios mundialmente famosos, é celeiro de intelectuais e esportistas, tem empresas de nível mundial, lidera vários aspectos de tecnologia - nuclear, espacial, da informação etc. - e, até mesmo, produz barcos oceânicos, feito mais impressionante se lembrarmos que é um país mediterrâneo. A Confederação Helvética, não obstante ser a democracia mais antiga em vigor no mundo, não tem uniformidade nem de idioma entre os 4 povos que a formam, embora, neste final de semana, mais precisamente no dia 11 de março de 2012, a Suíça tenha dado uma demostração de unidade em uma votação.
Na democracia direta suíça, consultas populares não são novidade. O interessante, no caso em tela, foi a resposta dos eleitores suíços - os quais, por sinal, podem votar pelo correio - a um questionamento. O sindicato Travail Suisse questionou o povo sobre a ampliação em 50% do período de férias dos trabalhadores. Ao contrário do que se poderia imaginar, 67% dos suíços recusou a proposta. Repito: 2/3 dos suíços, diante da opção de ter mais 2 semanas de férias, preferiu utilizá-las para trabalhar. Em todos os locais do país, a rejeição à proposta do Travail Suisse venceu em todos os colégios eleitorais da Confederação Helvética. A explicação é simples e poderosa: o povo suíço considerou que, se o país trabalhasse menos, todos perderiam.
Diante da reação dos eleitores suíços, fica a dúvida sobre como, caso fossem consultados sobre o mesmo assunto, os brasileiros votariam. O senso comum aponta para uma opção pela prorrogação das férias. Possivelmente, as primeiras pesquisas de opinião nacionais corroborariam tal visão: difícil imaginar que alguém optasse por, mantido tudo o mais igual, ter menos férias. O que não quer dizer que, na hora de decidir, o brasileiro não votaria como o suíço. Ideias que aparentam ser boas, como o aumento unilateral do período de férias, quando analisadas com calma pela população, podem ter seus efeitos de longo prazo melhor pensados. E, com isso, ser recusadas. Eu não ficaria de todo surpreso, portanto, caso, após amplo debate nacional, a primeira opinião, superficial, fosse suplantada pela opinião decorrente de análise profunda; na verdade, temos antecedentes, como no caso do direito a portar armas: a maioria da população, embora não possua nem pretenda possuir armas de fogo, entendeu que o governo não poderia proibir o povo de, quando desejado, exercer tal opção. Decisão mais suíça, impossível.
Por isso, o correto seria que outras medidas de impacto em debate atualmente, como a própria redução do número de horas trabalhadas, o controle da mídia, a proibição de palmadas, a adoção de cotas raciais, o banimento de agentes de sabor nos cigarros, a obrigatoriedade de conteúdo nacional nas televisões privadas, as restrições a moderadores de apetite, casamento entre homossexuais e a comissão da verdade, entre outros, fossem levados ao escrutínio popular. O governo, se tivesse coragem de exercer a democracia direta que os suíços exercem, arricar-se-ia a descobrir que, em alguns caso, talvez o povo não desejasse o mesmo que ele. A vontade do Brasil é a vontado do povo brasileiro, e não aquela dos mandachuvas da vez.
Por isso, é necessário que o povo seja sempre consultado. Em um país que possui justiça eleitoral permanente, caso raríssimo no mundo, e horário eleitoral gratuito (aliás, outro item que poderia merecia ser levado a votação, junto com a Voz do Brasil e o novo e exclusivo padrão nacional de tomadas), não seria complicado saber o que deseja quem, afinal, manda no país. Evidentemente, minha proposta jamais será aceita: é muito mais fácil esconder-se em comissões, com participação popular justificada por audiências soi-disant públicas, e decisão colegiada, do que expor-se e deixar que o povo decida. Pena. Porque inexoravelmente chegará o dia no qual alguém terá coragem de ser avaliado pelo povo e proporá a adoção de democracia direta para qualquer assunto que interfira na vida privada dos brasileiros. Uma vez adotada, não será possível suprimí-la em ambiente democrático. E o povo brasileiro, finalmente, será senhor dos destinos do Brasil.
Pedro Nascimento Araujo é economista.
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