Os Negros, os Judeus. A Humanidade e os seus Crimes.
Ontem, no momento em que me decidia por escrever um texto,
as sirenes tocaram por dois minutos em Jerusalém. Todos
os carros pararam, as pessoas puseram-se do lado de fora em posição de
reverência, e lá ficaram durante os dois minutos que durou esta homenagem aos
mortos do holocausto.
Estive na casa de Anne Frank em Amsterdã, aliás, sempre que
vamos a Amsterdã passamos necessariamente pela casa que a escondeu por quase
toda a guerra, pois fica situada em um ponto muito comum da cidade, algo como
uma avenida Julia Kubischek de Cabo Frio. Infelizmente a jovem Anne e sua
família foram descobertos em 1944, quando a guerra já estava praticamente
acabada, mas isto não impediu que a levassem para Auschwitz, e posteriormente
para Bergen-Belen, onde veio a falecer de Febre Tifóide.
Na casa, que hoje abriga um museu, assistimos a um vídeo
emocionante do seu pai, único a sobreviver ao campo de concentração, onde ele
diz que nunca imaginou que a filha pudesse ter escrito aquele longo diário. Ao
final do depoimento ele diz que a vida é assim, “sempre nos surpreendemos com
nossos filhos”. É emocionante, e ainda hoje sinto um nó a apertar-me a garganta
quando lembro ou falo deste fato.
Eu ia escrever sobre política local, mas ao abrir o “Globo
On Line” deparei-me com a foto da reverência judia aos mortos do holocausto e
mudei de humor, fiquei repleto de uma contrição dorida pela morte dos milhares
de inocentes que a história, ao longo da indelével marcha da humanidade,
produziu em função da busca pelo poder e pelo dinheiro.
Lembro aqui o último parágrafo do livro “O Evangelho Segundo
Jesus Cristo” de José Saramago, obra imprescindível para qualquer um que goste
de se dedicar ao tema. No livro, onde a figura de Jesus é finalmente humanizada
e realmente rica de uma generosidade verdadeira e crível, Saramago recria a
frase derradeira de Jesus, que enquanto agoniza na cruz teria tido a visão dos
milhares de mortos que a partir da sua morte se sucederiam, mortos pela
cruzada, pela Santa Inquisição, e tantas outras mortes em nome de Deus. Ao ver
isto, e ao perceber que estas mortes seriam exatamente em nome de Deus, Jesus
teria olhado para o alto onde viu o Pai a observar-lhe, voltando então o seu
olhar para a terra disse aos que lhe acompanhavam na agonia da cruz: “Homens,
perdoai-o, pois Ele não sabe o que fez.”
Uma vez em Cuba, numa das muitas vezes em que estive nos
postos de saúde de lá, lembro-me de um, em playa caeña, que tinha a foto que
publico acima. Na parede do posto está escrito, “vale mais a vida de um ser
humano do que todo o ouro do homem mais rico do mundo”. E assim deveria ser.
Queria terminar este texto lembrando também que se faz
apenas 67 anos que a segunda grande guerra terminou, faz também muito pouco
tempo que o Brasil assinou uma Lei que colocava fim a um holocausto tão
dolorido quanto o dos judeus. O holocausto dos negros africanos submetidos à
condição de escravos e trazidos para as Américas.
Os números são vexaminosos. Esta mancha da civilização
judaico-ocidental-cristã, branca e educada, não se extinguirá. Os escravos que
aqui chegaram tinham uma sobrevida média de cinco meses, foi uma barbárie que
também deve ser lembrada pelo futuro das nossas gerações, para que jamais
passemos novamente por experiência como aquela.
Lembro, entretanto, que em muitas partes do mundo os
esforços para abolir o trabalho escravo ainda são insuficientes, e deixo aqui,
para reflexão, a frase da Conselheira da ONU, Dra.Gulnara Shahinian, proferida
no dia 02 de dezembro passado durante as comemorações do Dia Internacional para
Abolição da Escravatura:
“A escravidão não é história.”
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